domingo, 18 de novembro de 2012

Resumo (Escravidão, Liberdade e Resistência em Sergipe: Cotiguiba 1860-1888)



RESUMO

            Este resumo é instrumento de avaliação à distância da disciplina de Temas de História de Sergipe II, coordenada pelo professor Lindivaldo, na qual faço uma abordagem sobre os principais pontos da obra de SHARYSE Piroupo do Amaral (Escravidão, liberdade e resistência em Sergipe: Contiguiba, 1860-1888). No qual tenho como objetivo fazer uma reflexão sobre o exposto nesta publicação de tamanha significância para a historiografia sergipana em especial para o período de grande ascensão econômica do nosso Estado, advindos dos engenhos de açúcar e a força do trabalho escravo.
Sharyse foi feliz em seu trabalho, quando de inicio buscou fazer um apanhado bibliográfico sobre a temática do negro e a sua relação com os senhores de engenho no Brasil e na América, trazendo o pensamento de grandes estudiosos desta temática, com visões semelhantes e opostas quando se tratando da questão da passividade negra e a vida nos engenhos e suas contribuições para a formação das famílias e a continuação cultural através das resistências camufladas na condição do paternalismo aceito pelo negro como forma de negociação para garantir melhores condições de sobrevivência, apresentando também as visões de pesquisadores que se opõem a Gilberto Freire, chegando a conclusões que não era nada ameno a vida dos escravos no Brasil nos engenhos, e que as condições de vida destes escravos variavam muito de acordo com sua atividade econômica, uma vez que a vida de um escravo urbano difere muito dos escravos dos engenhos e cuidadores da lida do gado.
Neste presente trabalho Sharyse, de forma inteligente faz um apanhado excelente da historiografia brasileira voltada para a questão do negro antes que adentre na temática no nordeste em especial em Sergipe na Contiguiba no período de 1860 a 1888, facilitando assim o entendimento do leitor da história local a partir de um paradigma maior que é a questão do trabalho escravo no Brasil. Em seu trabalho ela fala sobre as poucas fontes produzidas em Sergipe voltadas para esta temática, mas não deixa de apresentar as ideias de Felte Bezerra, Ariosvaldo Figueiredo e Maria da Glória de S. de Almeida, apresentando trechos que os aproxima das concepções de Freire quando diz que os engenhos da província sergipana tratava com tal diferença seus escravos em comparação com engenhos de outros estados tidos como exemplos os engenhos do recôncavo Baiano assim como podemos perceber na seguinte passagem copiado do referido trabalho:
Mal grado essas reações coletivas, a zona canavieira de Sergipe.
será uma das regiões, no Brasil, em que poderemos aceitar a
existência daquele tratamento relativamente humano, do senhor
para o escravo, de que fala Gilberto Freyre, ao estabelecer paralelo
entre o tratamento em muitas regiões escravas do Brasil e aquele
dado pelos estadunidenses. 14 (Felte Bezerra)
            percebemos ainda o reforço da passagem acima, quando Sharise menciona a citação feita por Bezerra quanto ao documento Memória sobre a Capitania de Sergipe, escrito em 1808 por Dom Marcos de Souza, vigário da Freguesia do pé do Banco atual cidade de Siriri, uma vez que contribui ainda mais para fortalecer a ideia de que se tinha cuidados mais brandos para com os escravos em Sergipe:

com vinte cativos fazem mais açúcar do que os do Recôncavo com
cem escravos. São mais bem tratados: nutridos com alimentos
saudáveis (feijão, vegetais, milho) enquanto no Recôncavo era a
carne salgada do Rio Grande [...] senzalas cobertas de telha,
enquanto eram de palha no Recôncavo. Vestem-se com algodão
manufaturado pelas escravas; casam-se na mesma família ou em outra.

            Além dos escritores acima já mencionados, tiveram envolvidos ainda com a temática da escravidão em Sergipe segundo Sharyse; a Professora Maria Nely dos Santos, Professor Lourival Santos, ambos consecutivamente tratando da questão abolicionista e da resistência dos escravos enfocando para a formação de quilombos, a criminalidade e as constantes agressões físicas, temas estes também analisados e abordados por Amâncio Cardoso, levando em consideração os anúncios nos jornais Recopilador Sergipano, O Raio e Jornal de Aracaju, e de relatórios de presidentes da província, objetivando demonstrar que os escravos resistiram à escravidão. Podemos perceber que após a excelente abordagem inicial adentrando para os acontecimentos em torno do setor açucareiro no Brasil do século XVIII ao final do século XIX, Sharyse sabiamente pode fazer um relação entre a realidade em Sergipe e a realidade nas demais províncias brasileiras envolvidas com a produção da cana de açúcar, para que assim pudesse desenvolver a sua temática que é compreender o comportamento dos escravos e libertos nas últimas décadas da escravidão na zona da Cotinguiba, a região mais próspera da província de Sergipe, dominada pela cultura da cana-de-açúcar. Após a segunda metade do século XIX, quando a escravidão brasileira começou a entrar em colapso, como os escravos sergipanos repensaram a escravidão? Quais as estratégias utilizadas para a obtenção da alforria? Nesse processo, quais as relações estabelecidas com os senhores? Havia algum tipo de solidariedade e identidade entre o escravo e o liberto? Quais as expectativas do escravo e do liberto em relação à liberdade? Quais as relações entre liberdade e trabalho?
            Sharyse em seu trabalho volta-se para as ultimas décadas do século XIX, abordando com enfoque as transformações ocorridas na segunda metade do século XIX que vão contribuir para modificar as relações entre senhores e escravos. Primeiramente, o fim do tráfico transatlântico de escravos para o Brasil, que trouxe como consequência a dificuldade na reposição da mão-de-obra e a nacionalização da escravatura. Em segundo lugar, a promulgação da Lei do Ventre Livre e seus efeitos: o acirramento das tensões cotidianas entre senhores e escravos, em um momento em que o campo jurídico surgiu como elemento demarcador dessas relações. Pois, como mostrou Sidney Chalhoub, a Lei de 1871, ao legitimar a formação do pecúlio e a compra da alforria pelo escravo, tirou dos senhores a principal base da política de dominação paternalista, que visava tanto à obediência do escravo, quanto a formação de dependentes. A partir das brechas da Lei de 1871 as ações de liberdade se intensificariam. Nestes processos cíveis, os escravos, através de seus curadores – muitos deles abolicionistas - acionavam a Justiça de forma a pressionar os senhores para que estes lhes concedessem a liberdade.
            Após as considerações apresentadas de inicio sobre a temática da cana de açúcar e a mão de obra escrava, Sharyse busca descrever as causas do desenvolvimento da cana de açúcar na região da Cotiguiba apresentando a importância das vias fluviais através das seis bacias que banham o estado e a excelente qualidade do solo encontrada naquela região como assim podemos observar: A região da Cotinguiba, tal como o Recôncavo baiano, possuía os solos de massapê, argilosos, escuros e pesados, que retinham bem a umidade e era preferidos para o cultivo da cana-de-açúcar, a cultura mais rentável no período colonial. Lá eram encontrados também os “salões”, solos avermelhados, mais leves que o massapê, mas também muito férteis. A região tinha o transporte facilitado pela navegação dos grandes rios e de seus numerosos afluentes durante a maré cheia. Numa época em que existiam poucas estradas - e as que existiam frequentemente eram alvo de assaltos ou causas de acidentes, devido ao péssimo estado, o transporte fluvial constituía importante fator de produção. A união desses três elementos - solo, clima e rios navegáveis - fez com que a Cotinguiba se tornasse o principal núcleo produtor de açúcar em Sergipe.
            Dentro da temática Sharyse coloca sobre questionamento o crescimento do numero de engenhos em Sergipe nos séculos XVIII e XIX, questionando a origem do capital para o investimento nos engenhos para produção de açúcar, levando em consideração a falta de informação que comprove a origem do mesmo, baseando assim no que disse Josué Subrinho argumentando ser provável que com o novo “boom” do açúcar, no final do século XVIII, as terras propícias à cultura da cana tenham sofrido uma valorização, e que os agricultores sergipanos tenham vendido parte dessas terras, aplicando o capital adquirido com a venda na montagem de engenhos. Esse fracionamento da terra explicaria aquele crescimento. Sendo que para Maria da Glória Almeida o crescimento do número de engenhos pode ser explicada pela subdivisão por herança; pela doação ou venda de parte das terras das posses maiores; ou ainda pela baixa tecnologia - que limitava a expansão dentro de cada engenho, obrigando os senhores a montarem novos engenhos quando havia aumento de produção.
            Fica evidente aqui ainda que apesar do desejo de Sergipe tornar-se independente economicamente da Bahia, este desejo não fora consumado uma vez que a Bahia era quem dispunha das condições para escoamento da produção, sendo assim um intermediário entre a produção de Sergipe e os mercados exteriores. Observa-se ainda que após todas as transformações e expectativas em torno do mercado açucareiro o auge da economia açucareira na região ocorrera por volta de 1850, momento de alta no preço do açúcar. Por esta época se multiplicavam os núcleos urbanos da região da Cotinguiba, que se tornava a região mais próspera da província. Laranjeiras e Maruim eram os dois mais importantes núcleos urbanos, por seus portos o açúcar era escoado, bem como saíam e entravam alimentos e outras mercadorias. O desenvolvimento de um e de outro município ocorrera paralelamente ao crescimento da economia do açúcar, e de simples vilas na primeira metade do século XIX, tornaram-se importantes cidades, residência dos políticos, comerciantes e intelectuais sergipanos.
            Não posso deixar de destacar, a visão que o negro tinha de sua vida e sua forma de existência, que fica claro na ideia de Sharyse que não condizia com aquilo escrito por Dom Marcos vigário do Pé do Banco como observamos no inicio deste resumo, insinuando que os escravos daqui tinham uma vida mais branda do que a dos escravos dos estados vizinhos, uma vez que não é isso que mostra Sharyse ao observar e escrever que em Sergipe, as primeiras décadas do século XIX – momento conturbado politicamente devido à independência do Brasil e às disputas pelo poder decorrentes da emancipação da província perante a Bahia - foram marcadas pelas revoltas de escravos, pelas fugas e formação de quilombos. Mas, do ponto de vista senhorial, adotado pelo vigário, e em comparação com o tratamento dispensado pelos senhores baianos, talvez a informação não fosse toda ela incorreta. Sergipe era um tradicional produtor de gêneros de subsistência, o que explicaria a abundância de cereais na dieta dos escravos, diferentemente do Recôncavo baiano, que lutava contra a escassez de alimentos. Por outro lado, mais pobres, com uma produção de açúcar ainda incipiente, os senhores sergipanos teriam motivos para incentivar o cultivo de roças pelos escravos, que assim bancavam, eles mesmos, parte de sua alimentação. A pobreza também explicaria o incentivo aos casamentos e a reprodução natural de seus escravos.
            Sheryse lembra que Sergipe por ter sido um dos últimos estados do Nordeste a entrar no sistema produtivo açucareiro usando-se de mão de obra escrava, também foi um dos últimos a efetivar a abolição. Segundo Subrinho em relação à redução da população escrava de Sergipe, ele apontou que no período entre 1873 e 1886, ainda era mais fácil para um escravo morrer do que conseguir a alforria. Comparando as taxas de Sergipe com as de outras províncias nordestinas, analisadas por Slenes, ele afirma que Sergipe detinha a menor média de alforrias do Nordeste, estando abaixo, inclusive, da média nacional. Subdividindo este período em dois, o autor percebeu que no primeiro, de 1873-1882, na Cotinguiba morreram 2.100 escravos, enquanto foram alforriados apenas 875. Já no período de 1882 a 1886, foram alforriados 1.258 escravos, contra 693 mortes.
            Sendo que somente a partir de 1886 o número de cartas de alforria tem um crescimento significativo, algumas concedidas de forma onerosa outras gratuitas, observando Subrinho que muitas poderiam estar sendo cedidas por troca de contratos de trabalhos ou serviços ou mesmo em resposta a desagregação do escravismo. Outro ponto importante abordado por Sharyse é a relação entre a insistência dos senhores de escravos em não garantir a liberdade já promulgada na lei do ventre livre, insistência esta apoiada na interpretação da lei na qual deixa o filho do escravo menor de 21 anos sob a tutela e cuidados dos senhores de escravos sendo assim ele o mesmo escravo quanto seus pais e para bem exemplificar Sharyse traz a passagem da carta registro de Joanna Maria de Meneses Barreto expondo sua vontade de forrar o mulatinho Agripino:
Dentre os bens que livremente possuo é bem assim um mulatinho
de nome Agripino de ventre livre [...] de idade de um mês e meio,
filho natural da escrava Leonôr, cujo mulatinho pela estima que lhe
tenho lhe dou a liberdade da condição dos 21 anos conforme marca
a lei acima mencionada, no valor de cem mil réis que serão levados
em minha terça[...]
            Vejamos que a partir de então as relações de oposição entre senhores e escravos permanecem da mesma forma, uma vez que os senhores detinham-se da lei para prolongar a escravidão de seus tutelados enquanto que os escravos e livres faziam esforços e tentavam a libertação dos seus através da compra de alforrias. Outra forma de se conseguir a alforria era através do fundo de emancipação, sendo que apesar de em um todo geral o fundo não ter conseguido forrar um numero expressivo assim como pretendido, em Sergipe os números do fundo faram significantes, uma vez que na região da Cotiguiba Segundo os dados de Subrinho, o fundo foi responsável, ao menos em parte, por 38,14 % das alforrias onerosas da província entre 1873-1886. Em muito dos casos os escravos pagavam parte do pecúlio e o fundo arcava com restante para aquisição da alforria.
            Outro ponto que não pode passar despercebido é a questão da corrupção diante ao fundo de emancipação, uma vez que Sharyse aproveita a denuncia de Francisco José Alves para transpor a sabedoria dos senhores de engenhos, no momento de se fazer a devida classificação para concessão Alforrias, assim como podemos observar na denuncia de Francisco José Alves: A lei de 28 de Setembro de 1871, nesta província, é letra morta; aqui se inverte [sic] todos os dias a ordem da classificação dos escravos; arreda-se da classificação aqueles que estão na primeira classe, para dar-se preferência a outros que estão na quarta e quinta classe, e que pertencem a senhores favorecidos da fortuna, que por esta razão vão aproveitando bom dinheiro por escravos velhos e inutilizados que eles tinham obrigação de os sustentar, em virtude da lei já citada. Isso é mais uma forma de demostrar o apego dos senhores Sergipanos ao sistema escravista. Sendo assim apresento minha visão desta luta entre a liberdade e o interesse dos senhores pelos escravos baseando-me em SCHWARTZ, que apesar dos negros estarem vivendo num época sem oportunidade e se espaço dentro da sociedade, eles mesmo assim preferiam a liberdade pagando por ela, ao invés da escravidão, ou seja, não era nada amena a vida dos escravos nas senzalas, assim como havia citado antes Gorender que defendia que a violência era inerente ao sistema e o escravo era visto, nas relações sociais, apenas como objeto. Chega a afirmar que a única forma de humanidade dos cativos no sistema escravista era através do crime: fugas, rebeliões e atos violentos dos escravos.
            Já no período pós-abolição, observamos as citações de desprezo e de insignificância do negro como homem livre, atrelados ao julgo de preguiçoso e inútil, sendo que o negro neste momento de transição ainda não haveria assimilado que o ser livre não condizia ao não querer trabalhar, situação essa que agravou o sistema econômico e levou muitos senhores a um estado de tal preocupação com a escassez da mão de obra que afetava muito a lavoura. Havia critica por todo lado quanto à liberdade concedida aos negros, pois estes havia tornados ócios, sendo que muitos senhores buscaram criar leis que obrigassem os negros terem um contrato de trabalho, tendo como consequência se não o tivesse a prisão. Essa era uma forma de trocar os domínios do senhor pelo domínio da policia. Sendo que apesar da qualificação dada aos negros de ócios e preguiçosos nem sempre esta afirmação poderia ser considerada como um todo, pois segundo Subrinho, na concepção dos senhores sergipanos, era considerado ócio qualquer forma de subsistência que não o trabalho intenso e regular nas grandes propriedades, por isso se discutiu meios de diminuir as alternativas de subsistência dos libertos. Pois assim diminuindo as alternativas de subsistência dos negros estes seriam obrigados a voltarem para a lavoura.
           Apesar desta visão negativa, da relação negro livre e senhores de terras no período que compreendeu o pós-abolição no território Sergipano, podemos observar alguns exemplos que poderiam ser seguidos pelo restante dos senhores de engenhos da província, mesmo sendo pouco os casos, Sharyse tem o cuidado expor a fala de Francisco Alves noticiando os experimentos do trabalho livres, apontando para o experimento do major Vicente de Oliveira Ribeiro que, segundo Alves, herdara metade do engenho Varzinhas e oito ou dez escravos. Conseguiu aumentar a produção de açúcar devido ao aluguel de homens livres para o plantio e para a moagem da cana. Além disso, “não querendo lutar com a dificuldade de trabalhadores incertos, morando uns aqui, outros acolá, transformou as antigas senzalas do engenho Varzinhas, em pequenas casas aceiadas [sic], para aqueles trabalhadores que quisessem morar na fazenda”, dando tarefas diárias a eles e às suas mulheres e filhos. E para finalizar este meu resumo baseado nesta excelente obra de Sheryse, colo aqui o que disse Alves defendendo o trabalho livre sem tortura e maus tratos afirmando existir condições para o crescimento da produção através de mão de obra livre pondo fim a escravidão, pois Alves afirmou que a produção provincial crescera após o fim do tráfico e que, se isto se deveu em parte à introdução de máquinas a vapor, ocorreu também pelo emprego de mão-de-obra livre, que os senhores “foram obrigados a chamar [...] embora somente em seis meses do ano”, como forma de repor os braços perdidos pelo tráfico, pelas vendas e pela cólera. Não especificou de que forma este trabalho era feito, parecendo tratar-se de jornal ou empreitada. Concluía que a abolição era possível, e que o governo deveria marcar um prazo máximo de sete anos para o fim do trabalho escravo.



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